DOCUMENTOS

Aqui vou disponibilizar documentos históricos de acordo com os temas de aula.
Adoraria receber contribuições!

Artigo sobre O ENCONTRO DOS EUROPEUS E DOS NATIVOS  no blog da professora Ana Paula e que transcrevo aqui:



Quantos milhões de pessoas viviam na América antes da chegada do europeu no final do século XV? É impossível responder a essa pergunta com precisão.


Calcula-se, entretanto, que existia em todo o continente americano (com 42 milhões de km2) uma população de aproximadamente 88 milhões de habitantes, concentrada principalmente na América Central e no norte da América do Sul. Era uma massa populacional então correspondente a cerca de 20% da humanidade.

Também são variadas as estimativas sobre a população indígena total que vivia no Brasil. Algumas indicam cerca de 2,5 milhões de índios, no início do século XVI, enquanto outras apontam aproximadamente 5 milhões.

Nesse mesmo período, Portugal e Espanha não possuíam, juntos 11 milhões de habitantes. E foram principalmente portugueses e espanhóis que conquistaram brutalmente os povos americanos. Uma das mais sangrentas conquistas registradas em toda a história humana.

Formas de violência:

Embora tenha resistido, lutando bravamente, a população nativa da América foi drasticamente reduzida num curto período de tempo (cerca de 50 anos). Por meio da violência militar, da violência econômica e da violência cultural, metade, ou até dois terços, da população dos povos pré-colombianos foi dizimada.


Como? Por quê?

1º) As armas dos conquistadores europeus eram superiores às dos povos pré-colombianos: com as armas de fogo (mosquete, canhão) o conquistador evitava o combate corpo a corpo, além de provocar enorme susto devido à explosão. Os pré-colombianos não conheciam armas de fogo.

2º) O cavalo dava grande mobilidade ao conquistador durante os combates. Animal desconhecido dos povos da América, provocava enorme pavor. No princípio, os índios "viam" cavaleiro e cavalo como um só conjunto, inseparáveis, uma coisa só.

3º) As armas feitas de aço (espadas, lanças, punhais, escudos) também ajudavam aos europeus já que eram mais resistentes na defesa e eficientes no ataque. Entre as armas utilizadas pelos indígenas estavam: arco e flechas envenenadas, pedras, lanças, machados, atiradeiras de pedra.

Mas, a superioridade das armas europeias não explica por si só a vitória do conquistador sobre os nativos americanos. Os índios eram numericamente superiores, chegando a representar cerca de 500 a 1000 índios para cada europeu. 

Temos ainda um 4º fator a favor dos europeus: trata-se da chamada "guerra microbiana", isto é, diversas doenças infecciosas tazidas pelos europeus (sarampo, tifo, varíola, malária, gripe) eram letais para os índios, que não tinham resistência imunológica a elas. Tais doenças provocavam grandes epidemias, matando aldeias inteiras.

Contaminado por essas doenças, que ignorava e não sabia combater, o indígena sofria duplo impacto (físico e psicológico), pois supunha, muitas vezes, estar sendo castigado pelos seus deuses.

Desse modo, entregava-se ao mais desolador sentimento de apatia. Que o matava também, muitas vezes.
E os índios hoje? 

Hoje, no Brasil, vivem cerca de 460 mil índios, distribuídos entre 225 sociedades indígenas, que significam apenas 0,25% da população brasileira, considerando-se tão-somente aqueles indígenas que vivem em aldeias. Há estimativas de que, além destes, ainda existam de 100 a 190 mil deles vivendo fora das terras indígenas, inclusive em áreas urbanas. Há também 63referências de índios ainda não-contatados no território brasileiro.

Quer saber mais? Consulte o site da FUNAI.http://www.funai.gov.br/indios/conteudo.htm#HOJE

Boa pesquisa e reflexão. 

Postado por ANA PAULA MOGETTI no TEM MAIS NO BLOG! em 9/03/2010


Fragmento da Relação do Piloto Anônimo,documento que, junto com a Carta de pero Vaz de Caminha, nos informa sobre os primeiros contatos entre europeus e nativos da terra que viria depois a se chamar Brasil.
fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histdescob4.htm

"Os dois bandidos que tinham ficado no lugar puseram-se a chorar quando da partida"

Relação do Piloto Anônimo

O BRASIL

De como as naus discorriam com a borrasca (2)

A 24 de abril (3), quarta-feira da oitava de Páscoa, a armada avistou terra, o que causou grande prazer a todos. Decidimos ver que tipo de terra era e descobrimos que o lugar abundava de árvores e que havia muita gente caminhando pela praia.

Lançamos âncora na foz de um pequeno rio. O capitão mandou baixar um batel ao mar e ordenou que se verificasse que tipo de gente era aquela. Os homens da armada notaram que era gente de cor parda -entre o branco e o negro-, de boa compleição e de cabelos compridos, notaram ainda que andavam nus como tinham nascido, sem vergonha nenhuma. Todos traziam os seus arcos com flechas, aparentando estarem prontos para defender aquele rio. Não havia no batel ninguém que pudesse compreender a sua língua, o que obrigou os homens a retornarem ao capitão.

Entrementes, fez-se noite e despencou uma enorme tempestade.

Na manhã do dia seguinte, ainda em meio à tempestade, levantamos âncora e costeamos rumo ao norte em busca de um porto onde a armada pudesse deter-se. Soprava o siroco.

Finalmente, encontramos um lugar onde deitar âncora. Havia lá alguns homens da terra que pescavam em umas barquetas. Um dos nossos batéis foi ao encontro desses homens, capturou dois deles e os trouxe à presença do capitão, que desejava saber que tipo de gente era. Todavia, não conseguíamos nos entender nem por fala nem por gestos. O capitão ainda os deteve a bordo durante toda aquela noite, ordenando, no dia seguinte, que se lhes pusessem camisa, casaco e barrete vermelho e os deixassem em terra. Eles ficaram muito contentes com as roupas e se maravilharam com tudo o que lhes foi mostrado.

Uma raiz com a qual fazem pão e outros dos seus costumes.

Naquele mesmo dia, 26 de abril da oitava de Páscoa, determinou o capitão-mor que se ouvisse missa, mandando erguer uma tenda e um altar num determinado sítio, para onde todos da armada se dirigiram e ouviram a celebração e a prédica. Os homens da terra que se encontravam nas proximidades bailavam, cantavam e tangiam uma espécie de trombeta. Imediatamente depois da cerimônia, dirigimo-nos para os navios. Nessa ocasião, os homens da terra entraram no mar, com água até abaixo dos sovacos, dançando e cantando com grande alegria e alvoroço. Terminado o jantar do capitão, tornamos a desembarcar e buscamos distração e divertimento junto aos homens da terra, que começaram a negociar com os da armada, trocando os seus arcos e flechas por guisos, folhas de papel e peças de pano.

Prazerosamente despendemos todo aquele dia na sua companhia e retornamos tarde para os navios. Encontramos, no lugar, um rio de água doce.

No dia seguinte, o capitão-mor determinou que se fizesse a aguada e que se recolhesse lenha. Os homens da armada dirigiram-se, então, para a praia e, no cumprimento dessas suas tarefas, contaram com a ajuda dos homens da terra. Alguns dos nossos foram até o lugar onde viviam esses homens, três milhas afastado do mar. Uma vez lá, negociaram uns papagaios e uma raiz de nome inhame; essa raiz faz as vezes de pão entre eles e também é comida pelos árabes (4). Tais artigos foram trocados por guisos e folhas de papel.

Permanecemos cinco ou seis dias nesse lugar, cuja gente é escura, tem os cabelos longos e a barba pelada. Eles andam nus, sem nenhuma vergonha, e trazem as pálpebras e a região abaixo da sobrancelha pintadas com figuras nas cores branca e preta e azul e vermelha. O lábio da boca, isto é, o inferior, é furado e o buraco é atravessado ou por um osso tão extenso quanto um prego, ou por uma comprida pedra verde ou azul, a qual fica dependurada no dito orifício. As mulheres, muito belas de corpo, andam também nuas e sem nenhuma vergonha. Seus cabelos são igualmente longos. As casas em que vivem são de madeira, cobertas com folhas e galhos de árvores e sustentadas por muitas colunas de madeira. No meio dessas casas, entre as colunas e a parede, eles dependuram redes de algodão -que podem acomodar um homem- e entre elas fazem uma fogueira. Uma única casa pode abrigar entre 40 e 50 leitos armados como teares.

Dos papagaios da terra há pouco descoberta

Não vimos neste lugar nem ferro nem outros metais. Os homens da terra cortam a madeira com pedras. Pássaros há muitos e de variados tipos, especialmente papagaios, os quais podem ser de muitas cores e alcançar o tamanho de uma galinha. Há outras aves igualmente belas, cujas plumagens são usadas pelos homens da terra para fazer os chapéus e barretes que usam. A terra é abundante em árvores de diferentes tipos e tem uma água excelente, além de inhames e algodão. Não vimos nenhum animal.

O lugar é grande e não sabemos se é ilha ou terra firme, porém, por sua grandeza supomos tratar-se de terra firme. O clima é muito bom. Os homens da terra, que são grandes pescadores, confeccionam umas redes e pescam variados tipos de peixe. Vimos um exemplar por eles pescado que tinha o tamanho de um tonel, mas era mais comprido e mais redondo, sem dentes e com a cabeça semelhante à de um porco. Seus olhos eram pequenos e suas orelhas, longas como um braço e largas como meio braço.

Por baixo do corpo, esse peixe tinha dois furos e sua cauda era do comprimento e da largura de um braço. Pés não se viam em nenhum lugar. A sua pele tinha pêlos como a do porco e era da grossura de um dedo. A sua carne era branca e gorda como a do porco (5).

Durante os dias em que estivemos ancorados, o capitão fez saber ao nosso sereníssimo rei do achamento desta terra e deixou nela dois bandidos, condenados à morte, que trazíamos na armada com esse propósito. O capitão prontamente despachou um pequeno navio de mantimentos, que acompanhava as 12 naus da esquadra, com cartas para o rei, relatando tudo quanto se tinha visto e descoberto. A seguir, desembarcou, mandou fazer uma grande cruz de madeira e determinou que a fixassem no solo. Os dois bandidos que tinham ficado no lugar puseram-se a chorar quando da partida, sendo consolados pelos homens da terra, que demonstraram ter piedade deles.


1- COLUNA PRESTES - 1924

O Manifesto de Santo Ângelo

É chegada a hora solemne de contribuirmos com nosso valoroso auxilio para a grande causa nacional.

Há 4 mezes a fio que os heroes de São Paulo vêm se batendo heroicamente para derrubar o governo de odios e de perseguições que só têm servido para dividir a família brasileira, lançando irmãos contra irmãos como inimigos encarniçados.

Todo o Brasil, de Norte a Sul, ardentemente deseja, no intimo de sua consciência, a vietoria dos revolucionarias, porque elles luctam por amor do Brasil, porque elles querem que o voto do povo seja secreto, que a vontade soberana do povo seja uma verdade respeitada nas urnas, porque elles querem que sejam confiscadas as grandes fortunas feitas por membros do governo a custa dos dinheiros do Brasil, porque elles querem que os governos tratem menos da politicagem e cuidem mais do auxilio ao Povo laborioso que numa mescla sublime de brasileiros e estrangeiros, irmanados por um mesmo ideal, vive trabalhando honestamente pela grandeza do Brasil.

Todos desejam a victoria completa dos revolucionarias, porque elles querem o Brasil forte e unido, porque elles querem pôr em liberdade heroes officiaes da revolta de 5 de Julho de 1922, presos porque num acto de patriotismo, quizeram derrubar o governo Epitacio, o que esvaziou criminosamente o nosso thesouro, e porque quizeram evitar a subida do Governo Bernandes, que tem reinado a custa do generoso sangue brasileiro.

Todos sabem hoje, apezar da censura da Imprensa e do Telegrapho, apesar das mentiras officiaes espalhadas por toda a parte, que os revolucionarias têm recebido verdadeira consagração por onde têm passado e que até hoje não foram batidos.

Todos sabem que elles se retiraram para dar um descanço à tropa, que elles dispõem de toda a artilharia de São Paulo, ainda intacta, que dispõem de 20 milhões de tiros e de 5 mil fuzis novos, e que ainda não entraram em acção, que elles estão senhores da parte sul de Matto Grosso, a mais rica, de grande parte do Paraná, perfeitamente apparelhadas e que agora, voltam novamente à lucta, mais fortes do que nunca.

Todos sabem hoje que o Governo organizou successivamente 8 colunnas para bate-los e que foi forçado a desorganiza-las novamente porque as tropas do Exercito se negavam a combate-los e os de mais, que os combateram, foram dezimados como aconteceu com o Batalhão da Marinha e com a nossa Brigada Militar, agora, depois da entrada em seção da columna Rondon é o próprio governo quem confessa não ser mais possivel dominar a revolução no Brasil, porque a victoria della é já uma aspiração Nacional.

E o Povo Gaucho, altaneiro e altivo, de grandes tradições a zelar, sempre o pioneiro de grandes causas nacionais, levanta-se hoje como um só homem e brada: Já é tempo de fazer o governo respeitar a vontade do povo, já é tempo de restabelecer a harmonia na família Brasileira, já é tempo de lucrarmos não peito a peito, mas sim hombro a hombro, para restabelecermos a situação financeira do Brasil, para recobrar o dinheiro que os nossos maus governos nos roubaram e podermos, assim, evitar que, em 1927, o Governo lnglez venha tomar conta das nossas alfandegas e das nossas ricas colônias para cobrar a divida do Brasil.

Hoje, 29 de Outubro, por ordem do General lzidoro Dias Lopes, levantam-se todas as tropas do Exercito das guarnições de Santo Angelo, São Luiz, São Borja, ltaquy, Uruguayana, Sant'Anna, Alegrete, Don Pedrito, Jaguarão e Bagé, hoje irmanados pela mesma causa e pelos mesmos ideaes levantam-se as forças revolucionárias gauchas da Palmeira, de Nova Wutemberg, ljuhy, São Nicolau, São Luiz, São Borja, Santiago e de toda a fronteira até Pelotas e, hoje entram no nosso Estado os chefes revolucionarias Honorio Lemos e Zeca Netto, tudo de accordo com o grande plano já organizado.

E, desta mescla, desta comunhão do Exercito e do Povo, com nacionaes e estrageiros, resultará a rápida terminação da luta armada no Brasil, para honra nossa e glória dos nosso ideaes e de nossos foros de povo civilizado e altivo.

De acordo com o plano geral, as tropas de Santo Angelo talvez pouco demorem aqui, mas durante este tempo a ordem, o respeito a propriedade e a familia serão mantidos rigorosamente e para isso o governo revolucionaria provisório conta com o auxilio da própria população.

Não queremos perturbar a vida da população, porque amamos e queremos a ordem com base do progresso. Podem pois estar todos calmos que nada acontecerá de anormal.

São convocados todos os reservistas do Exercito a se apresentarem ao quartel do 1º Batalhão Ferroviario, e fica aberto o voluntariado.

Todos os possuidores de automoveis, carroças o cavalos deverão immediatamente po-los a disposição do 1º Batalhão Ferroviario e serão em todos os seus direitos respeitados.

Todas as requisições serão documentadas e assignadas sob a responsabilidade do Ministro da Guerra.

Pelo Governo Revolucionario do Brasil

Cap. Luiz Carlos Prestes 29/10/1924

FONTE: http://www.historiadobrasil.net/documentos/coluna_prestes.htm acesso em 18/07/10.

2- 85 anos da Coluna Prestes - uma epopeia brasileira
                                                 Anita Leocádia Prestes in http://www.ilcp.org.br/




A Coluna Prestes, sem vencer nem ser vencida pelo governo que combatia, percorreu 25 mil quilômetros para abalar as estruturas da República Velha


28 de outubro de 1924: começa o levante tenentista no estado do Rio Grande do Sul. Logo a seguir tem início a marcha rebelde que, mais tarde, entraria para a História como a Coluna Prestes (ou a Coluna Invicta) – episódio culminante do movimento tenentista.

Diante da grave crise estrutural (econômica, social, política, ideológica e cultural), que abalava a República no início dos anos 20 – a crise do “pacto oligárquico” estabelecido entre os grupos oligárquicos dominantes -, os setores médios mostravam-se insatisfeitos com a falta de liberdade e as limitadas possibilidades de influir na vida política. Predispunham-se à revolta e a apoiar ações radicais contra o poder oligárquico. Faltavam-lhes, contudo, organização e capacidade de arregimentação para assumir a direção do movimento de rebeldia contra o poder oligárquico estabelecido.

. A insatisfação no país era geral, mas foi a jovem oficialidade do Exército e da Marinha (os chamados “tenentes”) que assumiu a liderança das oposições. O tenentismo veio preencher o vazio deixado pela falta de lideranças civis aptas a conduzirem o processo de lutas que começava a sacudir as já caducas instituições políticas da Primeira República. Os “tenentes” assumiram as bandeiras de conteúdo liberal que, há algum tempo, já vinham sendo agitadas pelos setores oligárquicos dissidentes, dentre as quais se destacava a demanda do voto secreto, refletindo o anseio generalizado de liquidação da fraude eleitoral então em vigor. O que distinguia os “tenentes” das oligarquias dissidentes e dava ao seu liberalismo um caráter radical era a disposição de recorrer às armas na luta por tais objetivos.

A primeira revolta tenentista, rapidamente sufocada tanto no Rio de Janeiro como em Mato Grosso – os únicos lugares em que chegou a ser deflagrada -, imortalizou-se pelo episódio do levante dos 18 do Forte de Copacabana, no dia 5/07/1922. Liderados pelo tenente Antônio de Siqueira Campos, um pequeno grupo de jovens militares marchou pela praia de Copacabana, de peito a descoberto, disposto a enfrentar os disparos das tropas governistas. Manchando de sangue as areias de Copacabana, os jovens foram trucidados. Apenas dois conseguiram sobreviver: os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes. O episódio repercutiu por todo o Brasil, apesar do estado de sítio e da censura à imprensa, decretados pelo Congresso Nacional. E os nomes dos heróis do Forte tornaram-se símbolo do clima de revolta então existente contra os governos das oligarquias dominantes – os governos de Epitácio Pessoa e do seu sucessor Artur Bernardes. Ambos representavam, no fundamental, os interesses das oligarquias cafeicultoras de São Paulo e Minas Gerais e, dada a grave crise que abalava as estruturas do regime republicano, adotavam políticas econômiczas cada vez mais excludentes em relação aos grupos oligárquicos dos demais estados da União e aos diversos setores da sociedade brasileira da época.

Em 5/07/1924, dois anos após o levante de 1922, estourava a Rebelião de São Paulo, inaugurando uma nova onda de revoltas tenentistas. Era o “segundo 5 de julho”. Levantaram-se vários grupamentos policiais e unidades do Exército sediados nesse estado. O comando geral do movimento fora entregue pelos jovens rebeldes ao general reformado do Exército Isidoro Dias Lopes, que contava com a colaboração do major Miguel Costa, comandante da Força Pública de São Paulo (a polícia militar do estado).

O objetivo do movimento era depor o presidente Artur Bernardes, cujo governo transcorria, desde o início, sob estado de sítio permanente e sob vigência da censura à imprensa. Os rebeldes pretendiam substituir Bernardes por um político capaz de “moralizar os costumes políticos”. Lutava-se pelas mesmas demandas de caráter liberal já levantadas em 1922: além do voto secreto, “representação e justiça”, moralização dos costumes políticos e, de uma maneira geral, o cumprimento dos preceitos liberais da Constituição de 1891.

Durante 3 semanas, os rebeldes resistiram ao cerco das tropas governistas à capital de São Paulo. Ante o dilema de serem derrotados pela superioridade militar das tropas governistas ou e retirarem para outra região, onde fosse possível rearticular o movimento, o general Isidoro optou pela segunda alternativa. Sempre perseguidos pelos adversários mais numerosos e bem-armados, os rebeldes conseguiram chegar ao oeste do estado do Paraná, onde se estabeleceram. Logo enfrentariam as tropas comandadas pelo general Cândido Mariano Rondon, que se havia oferecido a Artur Bernardes para dar combate aos militares rebelados.

A conspiração tenentista prosseguiu durante todo o ano de 1924. Após o levante paulista, ela atingiu um ritmo mais acelerado no Rio Grande do Sul, estado em que viria a contar com o apoio dos maragatos (os libertadores) liderados pelo rico fazendeiro Joaquim Francisco de Assis Brasil. As condições precárias dos rebeldes paulistas, cercados no oeste do Paraná, contribuíram para aguçar o espírito de luta da jovem oficialidade comprometida com a chamada “revolução”, levando-a a mobilizar-se em solidariedade aos companheiros de São Paulo.

O principal coordenador da conspiração militar no Rio Grande do Sul foi o tenente Aníbal Benévolo, jovem oficial da Brigada de Cavalaria de São Borja. Também foram importantes na deflagração do levante gaúcho o capitão Luiz Carlos Prestes e o tenente Mário Portela Fagundes. Ambos haviam servido no 1º Batalhão Ferroviário (1ºBF) de Santo Ângelo e mantido contato estreito e permanente com a tropa.

Na noite de 28 de outubro, levantou-se o 1º BF, sob o comando de Prestes e Portela, e, na madrugada do dia 29, algumas outras unidades militares nesse mesmo estado. Ao mesmo tempo, vários caudilhos ligados a Assis Brasil aderiram ao levante. As tropas dos maragatos, de lenço vermelho no pescoço, incorporaram-se às diversas unidades rebeladas, constituindo um reforço para a “revolução” tenentista.

As forças governistas foram rapidamente mobilizadas e lançadas contra os rebeldes. Devido à falta de coordenação entre as unidades rebeladas e à espontaneidade de suas ações, em poucos dias estavam desbaratadas. A “revolução” conseguiu sobreviver apenas na região de São Luís Gonzaga: primeiro pelo fato de a cidade se encontrar distante de qualquer linha férrea, o que, naquela época, dificultava o acesso das tropas governistas, retardando sua investida contra os rebeldes; segundo por conta do papel decisivo do capitão Prestes na reorganização das tropas. Na prática, Prestes passou a comandar não só o 1º BF, que viera com ele de Santo Ângelo, como também os elementos militares e civis remanescentes dos diversos levantes ocorridos no estado.

A atuação prévia de Prestes no 1º BF, durante quase 2 anos, levara-o a introduzir nessa unidade não só um novo tipo de instrução militar como também um novo tipo de relacionamento, até então desconhecido no Exército brasileiro, entre os soldados e o seu comandante. Assim, o jovem capitão, preocupado em garantir uma boa alimentação para a tropa, adotou uma série de medidas, por exemplo, a contratação de um padeiro e um cozinheiro. Organizou as atividades e o tempo dos seus subordinados de maneira que todos pudessem estudar, receber educação física e instrução militar, além de trabalharem na construção da linha férrea que ligaria Santo Ângelo a Giruá (RS). O próprio Prestes tornou-se professor e criou três escolas: uma para alfabetização e as outras duas de primeiro e segundo graus. Em 3 meses, não havia analfabetos na companhia. Prestes não só comandou seus soldados como, ao mesmo tempo, trabalhou junto com eles, levando a mesma vida de seus subordinados. O jovem capitão conseguia estimular a iniciativa dos soldados, sem desprezar a disciplina, que era obtida com o exemplo do próprio comportamento e excluía a prática de qualquer tipo de violência. Em conseqüência, o prestígio de Prestes se tornou enorme, garantindo a fidelidade do 1º BF na hora do levante.

Em São Luís Gonzaga, Prestes enfrentou a necessidade de organizar a resistência ao ataque inimigo em preparação. Foi assim que o 1º BF transformou-se na espinha dorsal da tropa rebelde, que ficaria conhecida como a Coluna Prestes.

Em dezembro de 1924, 14 mil homens, sob o comando do Estado-Maior governista, marchavam sobre São Luís Gonzaga. Formavam o chamado “anel de ferro”, com o qual se pretendia estrangular os rebeldes – cerca de 1,5 mil homens, armados precariamente e quase desprovidos de munição –, acampados em torno da cidade. O governo adotava a “guerra de posição” – a única tática que os militares brasileiros conheciam e que, de acordo com o modelo dos combates travados durante a Primeira Guerra Mundial, consistia em ocupar posições, abrindo trincheiras e permanecendo na defensiva, à espera do inimigo. Ou, então, quando as posições inimigas estavam localizadas, definia-se o “objetivo geográfico” para onde se deveria marchar, com a meta de cercar o adversário, tendo como paradigma o famoso sítio de Verdun, que durara meses, no ano de 1916, quando se defrontaram os exércitos da Alemanha e da França.

Prestes, assessorado por Portela, põe então em prática a “guerra de movimento” – uma espécie de luta de guerrilhas, então uma novidade para o Exército brasileiro. O rompimento do cerco de S. Luís pelos rebeldes e a marcha vitoriosa da Coluna comandada por Prestes em direção ao norte, visando socorrer os companheiros de São Paulo, cercados pelas tropas do general Rondon, constituiu a primeira grande vitória da nova tática militar imaginada por Prestes.

Em 12/04/1925, na cidade paranaense de Foz do Iguaçu, deu-se o encontro histórico das tropas gaúchas com os rebeldes paulistas. A proposta de Prestes de prosseguir na luta, dando continuidade à Marcha rebelde acabou prevalecendo. O principal objetivo era manter acesa a chama da rebeldia tenentista e, com isso, atrair as forças inimigas para o interior do país – o que poderia contribuir para o êxito dos “tenentes”, que conspiravam no Rio de Janeiro e em outras capitais, preparando novos levantes.

Após a junção das colunas paulista e gaúcha, as tropas rebeldes foram reorganizadas, criando-se a 1a Divisão Revolucionária, constituída pelas brigadas “São Paulo” e “Rio Grande”, sob o comando do major Miguel Costa, o oficial de maior patente, promovido a general-de-brigada pelo general Isidoro. Ao todo, a divisão contava com menos de 1,5 mil combatentes, sendo oitocentos da coluna gaúcha e os restantes da coluna paulista. Havia cerca de 50 mulheres, entre gaúchas e paulistas, que, na maioria dos casos, acompanhavam seus maridos e companheiros.

A formação da 1a Divisão Revolucionária representou a vitória da perspectiva aberta por Prestes de os rebeldes atravessarem o rio Paraná e marcharem para Mato Grosso, dando continuidade à “revolução” tenentista. Enquanto as tropas paulistas haviam sofrido uma séria derrota em Catanduvas (PR), a Coluna Prestes vinha do sul coberta de glórias. Nessas circunstâncias, Prestes teria um papel destacado à frente da 1a Divisão Revolucionária. O general Miguel Costa tornara-se o comandante-geral, mas, reconhecendo a competência e o prestígio de Prestes, entregou-lhe, na prática, o comando da Coluna. A Coluna Prestes, que nascera no Rio Grande do Sul, partiu do Paraná revigorada pela junção com os rebeldes que se haviam levantado em São Paulo, a 5/07/1924.

A Coluna, além de mal-armada (não dispondo de fábricas de armamento e munição), não contava com uma retaguarda que assegurasse o abastecimento da tropa. Baseado na experiência do 1º BF, Prestes transformou a tropa rebelde num exército, em que vigorava a disciplina militar e, ao mesmo tempo, era estimulada a iniciativa dos soldados. Sem uma disciplina rigorosa e um comando único e centralizado, as forças rebeldes seriam desbaratadas. Mas, sem a participação ativa de cada soldado, sem a compreensão, de parte de cada um deles, de que a luta era pela libertação do Brasil do governo despótico de Artur Bernardes, seria impossível garantir a sobrevivência de uma força armada tão diferente: não havia soldo, nem pagamento de qualquer espécie, ou vantagens de qualquer tipo, e se exigia, para permanecer em suas fileiras, um grande espírito de sacrifício e muita disposição de luta.

A experiência dos maragatos foi valiosa na organização das forças rebeldes. Adotou-se, por exemplo, o método gaúcho de arrebanhar animais, as “potreadas”: pequenos grupos de soldados se destacavam da tropa em busca não só de cavalos para a montaria e de gado para a alimentação, como de informações, que eram transmitidas ao comando. Esses dados constituíram elementos valiosos para a elaboração de mapas detalhados sobre cada região atravessada pelos rebeldes, permitindo que a tática da Coluna fosse traçada com precisão e profundo conhecimento do terreno. Assim, reduziam-se os riscos de que os rebeldes acabassem pegos de surpresa pelo inimigo. Na verdade, era a Coluna Prestes que, com seus lances inesperados, surpreendia as forças governistas. As potreadas consistiam num fator fundamental para desenvolver a iniciativa e o espírito de responsabilidade dos soldados. Nas palavras de Prestes, foram “os verdadeiros olhos da Coluna”.

A Coluna não se poderia transformar num exército revolucionário, movido por um ideal libertário, se não incutisse em seus combatentes uma atitude de respeito e solidariedade em relação ao povo com que mantinha contato. Qualquer arbitrariedade era punida com grande rigor; em alguns casos de maior gravidade, chegou-se ao fuzilamento dos culpados, principalmente quando houve desrespeito a famílias e, em particular, a mulheres. Da mesma forma, não se admitiam saques ou atentados gratuitos à propriedade.

A Coluna Prestes durou 2 anos e 3 meses, percorrendo cerca de 25 mil quilômetros através de treze estados do Brasil (ver mapa). Jamais foi derrotada, embora tenha combatido forças muitas vezes superiores em homens, armamento e apoio logístico, tendo enfrentado ao todo 53 combates. Os principais comandantes do Exército nacional não só não puderam desbaratar a Coluna Prestes, como sofreram pesadas perdas e sérios reveses impostos pelos rebeldes durante sua marcha. A Coluna, em seu périplo pelo Brasil, derrotou 18 generais.

Ao adotar a tática da “guerra de movimento”, a Coluna Prestes garantiu a própria sobrevivência em condições que lhe eram extremamente desfavoráveis. E mais, transformou-se num exército com características populares. Paralelamente, forjou um novo tipo de combatente, de soldado da liberdade, que se batia por um ideal, e também formou líderes de envergadura que vieram a influir decisivamente nos acontecimentos posteriores.

Dado o fracasso governista no combate à Coluna Prestes, ela poderia continuar percorrendo o país, tirando proveito de sua mobilidade extrema, a grande arma que a tática da “guerra de movimento” lhe conferia. Mas Prestes compreendeu que havia chegado a hora de mudar de tática. Uma nova visão do Brasil – que ele adquirira durante a marcha, ao se deparar com a miséria em que vegetava a maior parte da população do país – contribuiu para essa conclusão. Dessa forma, o comando da Coluna tomou a decisão de partir para o exílio, ingressando na Bolívia em 3/02/1927. Como assinalou o cronista da Marcha, Lourenço Moreira Lima, “não vencemos, mas não fomos vencidos”.

Apesar das dificuldades, os rebeldes chegaram à Bolívia com o moral elevado, cônscios de que haviam cumprido o seu dever, sem nada receber em troca. Os comandantes e soldados da Coluna partiram para o exílio num estado de absoluta pobreza, enquanto os generais governistas tinham enchido os bolsos às custas do erário público, que lhes oferecera verbas generosas para liquidar os revoltosos. A Coluna, praticamente desarmada, contando apenas 620 homens, havia vencido todos os embates com as forças governistas.

Os soldados rebeldes foram os desbravadores do caminho que minou os alicerces da Primeira República. A sobrevivência da Coluna Prestes constituiu um fator decisivo para que, em diversos pontos do país, eclodissem levantes tenentistas. Embora essas revoltas militares – que sempre contaram com a colaboração de civis – tivessem sido esmagadas, a Coluna Prestes contribuiu para que, durante vários anos, fosse mantido um clima “revolucionário” no país, favorável à germinação das condições que levaram ao colapso da República Velha e à vitória da chamada Revolução de 30, propiciando o início de uma nova etapa no desenvolvimento capitalista no Brasil.

A Marcha da Coluna e o impacto causado em Prestes pela situação deplorável em que viviam as populações do interior do Brasil levaram o Cavaleiro da Esperança a se transformar, anos mais tarde, na principal liderança do movimento comunista no país. A Coluna Prestes gerara o líder mais destacado da revolução social no Brasil.

Última atualização em Qua, 19 de Maio de 2010 23:38