A escravidão índia, outrora desabrida com os recursos do aparato sádico da força bruta, hoje se traveste com requintes mais sutis, mas nem por isso menos cruéis.
Culturalmente amordaçado, o índio vive a pior das vidas; não é visto, não é ouvido, não é lembrado.
Gerações foram criminosamente adestradas a conceber o índio sob a ótica do folclore e da lenda, passo decisivo para a sua estigmatização social; um ser diferente do homem “civilizado”, que canta e se veste diferente de nós outros, que pinta o corpo e lança flechas, dança ritmos estranhos, vivendo assim despretensiosamente sem preocupar-se com os ingredientes que nos distinguem: SUA MATEMÁTICA NÃO É CONTÁBIL; SEUS LUCROS NÃO SÃO MATERIAIS; SUAS MÚSICAS NÃO BUSCAM AUDIÊNCIAS; SUAS PRECES NÃO NEGOCIAM O PERDÃO; SUA FILOSOFIA SE FAZ COM ÁGUA, TERRA, URUCUM, MANDIOCA, IGUALDADE E AMOR À VIDA.
Séculos de racionalismo embotado nos fizeram crer que mais evoluído é aquele que domina a tecnologia da morte ao que propaga a cultura da vida. Homens tecnologicamente superiores, portanto titulares da dominação de culturas e povos. Neste contexto, o índio é escravo da morte, mesmo sendo propagandista da vida.
Sugerem a vida, até mesmo quando se enforcam nas árvores. Recusam-se a crer que a divindade lhes presentearia com a escravidão do desprezo de seus irmãos brancos. Matam-se para viver de outro modo. Recusam a escravidão do desaparecimento da vida em vida. Olham para frente e não vêem futuro. Olham para os lados, pobreza, indigência, miséria, confinamento, exploração, fome, alcoolismo, desemprego, aculturamento, prostituição, preconceito. Olham para trás e recordam, pela oralidade de sua história, tempos idos em que índio era gente, pois toda gente tem o direito de viver. Não vivem, por isso se matam, mas se matam para viver de outro modo.
Nós, brancos irascíveis e embrutecidos, preocupados com o umbigo de uma civilização decadente e assassina, aprendiz da guerra, apologista da insensibilidade ao próximo, precisamos educar nossos espíritos para aprender com os índios que a vida é a imanência da natureza e portanto não vale a pena ser vivida a não ser com paz, liberdade e justiça.
Índios choram todos os dias suas Izabella Nardoni! Seus prédios são árvores. Quem são os seus assassinos ? Por que choramos a nossa Izabella e ignoramos a Izabella dos índios? Por que sequer estranhamos o fato de ÍNDIOS CRIANÇAS, ADOLESCENTES COMETEREM SUICÍDIO ? CRIANÇAS CEIFANDO A VIDA DE TANTA TRISTEZA...
A que ponto chegamos: insensibilidade que nos remete aos primódios da animalidade irracional.
Ora, se já conseguimos equacionar problemas tão graves e complexos: curas de doenças, fissão nuclear, nanotecnologia, cibernética quântica, por que não curamos doenças morais ?
Ser índio não é ser contra ninguém. É ser a favor da dignidade da pessoa humana. Esta dívida histórica tem que ser paga com urgência. Cabe àqueles que tem esperança de estancar este processo genocida a tarefa de levantar o povo e despertar a consciência cívica da nação. A omissão será cobrada pela história de forma implacável.
Vanderleia Mussi, estudiosa da causa indígena, indaga: “mas como pagar essa dívida? Que princípio é este que em nome da chamada diversidade cultural é construído com base em um discurso que resulta no processo subreptício e perverso em que os diferentes são convidados, em nome de um projeto democrático de feitio liberal, a se esvaziarem de toda identidade racial ou étnica, apaziguando e recompondo suas diferenças?”
Penso que esta pergunta deve ser respondida sob o pressuposto de que o índio não pode se deixar levar pela estratégia suicida da multiplicação de inimigos de sua causa, razão por que invadir propriedades adquiridas legalmente sob o argumento de que as terras lhes pertencem desde os seus antepassados só alimentará o processo de exclusão social. O direito de propriedade é a base do sistema econômico. Ameaçá-lo, violá-lo, transgredi-lo é o caminho mais curto para deslegitimar a luta do índio.
Certo, o índio faz jus à terra, mas este direito não pode ser efetivado com o sacrifício do direito de propriedade. A União precisa enfrentar este problema com responsabilidade, imparcialidade e urgência. Ela, a União, tem recursos para isso. Só não faz porque os agentes que circunstancialmente a representam ainda estão presos a ideologias decrépitas que não se simpatizam com os proprietários rurais.
É possível sim harmonizar os interesses e os direitos dos índios e dos proprietários rurais. Basta que a União aja com Justiça, respeitando os direitos dos índios e o direito de propriedade dos produtores rurais que, por estarem na legalidade, devem, no mínimo, ser indenizados com dignidade e respeito.
Portanto, na semana em que se comemora o dia do Índio, celebremos a Justiça como a única chave capaz de destrancar as janelas que nos impedem de ver um Brasil que respeite a propriedade de todos: brancos, negros e índios.
(*Fábio Trad é advogado militante em Campo Grande-MS, professor universitário e foi presidente da OAB-MS no triênio 2007-09)
FONTE: http://www.marcoeusebio.com.br/
Caros amigos! Passei algum tempo ausente mas descobri que muitas pessoas comentaram postagens antigas. Foi uma surpresa muito agradável! Este blog foi criado em 2008 com o objetivo ser mais uma ferramenta de aula. Em 2010 me transferi da escola e não havia condições de utilizá-lo. Agora, em 2013, retorno para uma unidade do Estado onde, acredito, o blog poderá servir, novamente,como complemento das aulas, estimulando a aprendizagem. Bons estudos!
Temos mais é que comemorar e muito o dia do índio, pois mesmo que muitos não reconheçam, eles são uma parte importântíssima da nossa cultura e do que somos hoje . Parabéns por toda garra e coragem que demonstraram ter ao longo de sua história ;]
ResponderExcluirCerto dia, minha irmã me contou uma história sobre um índio que tinha o corpo todo perfurado.
ResponderExcluirReza a lenda que "Uakti(dos índios Tukano)viveu ás margens do Rio Negro.
Seu corpo,aberto em buracos, recebia o vento e emitia um som tão irradiante que atraía todas as mulheres da tribo.
Os índios, enciumados, perseguiram UAKTI e o mataram,enterrando seu corpo na floresta.
Altas palmeiras ali cresceram; de seus caules os índios fizeram instrumentos musicais de sons suaves e melancólicos, feito o som do vento no corpo de UAKTI."
http://www.sonsdouakti.hpg.ig.com.br/sonsdouakti/grupo/grupo.htm
Tatiane - 3004